Virginia Woolf - A Duquesa e o Joalheiro e Outros Contos
Primeiro esboço do romance A senhora Dalloway, “A senhora Dalloway em Bond Street” foi publicado em revista, em 1923, e é completamente desprovido de trama: Clarissa Dalloway sai de casa às 11 da manhã para comprar um par de luvas, faz a pé o trajeto até a loja, encontra um conhecido, conversa com a balconista e escuta as conversas das outras clientes, realiza sua aquisição e o conto acaba.
Mas cada momento do passeio sofre uma dilatação extraordinária, tanto no tempo quanto no espaço ocupado pelo fluxo de consciência de Clarissa, sempre ativado pelos mínimos fatos que ela percebe ao longo do caminho: o Big Ben dá suas 11 badaladas por mais de uma página e por quase quatro páginas a mulher espera, em um cruzamento, que o guarda permita sua passagem.
As lembranças que se amontoam na mente e as pequenas impressões que percebe a cada vez, as pequenas malignidades diante do próximo, as reflexões mais profundas, alegres ou tristes, os projetos de como fazer prosseguir a jornada e as incumbências a tomar para preparar uma pequena festa à tarde, os estados de ânimo que passam incessantemente de uma insignificância de idílio a uma insignificância de raiva: tudo isso, pouco a pouco, se desenrola e se amalgama, fundindo-se com o que acontece ou não acontece do lado de fora e, ao mesmo tempo, delineando, com impressionante clareza, os traços de uma personalidade, e talvez de um destino.
Ainda mais rarefeito quanto aos eventos narrados é “A dama no espelho”, publicado em 1929 na Harper’s Magazine. Aqui a protagonista é, na verdade, uma casa vazia, momentaneamente abandonada pela proprietária, que saiu para cuidar de um jardim. Em um grande espelho, refletem-se os objetos e o mobiliário costumeiro, porém como que animados por vibrações novas, resultantes do jogo cambiante das luzes e das sombras provenientes das janelas. E aqui também o tempo e o espaço se dilatam, contendo ainda um componente visionário, que altera as dimensões e os papéis das coisas. Porém, dessa fantasmagoria de objetos deformados, emerge por fim o retrato de uma solidão feminina profundíssima e tocante, de uma evidência emotiva verdadeiramente miraculosa.
Muito diferente é “A duquesa e o joalheiro”, publicado em 1938 na Harper’s Bazaar, mas escrito em 1932. Mais do que um encontro-confronto de consciência, assistimos aqui a uma espécie de estudo social, no confronto entre um joalheiro judeu, que conseguiu sair do nada para se tornar um dos mais importantes de Londres, e uma velha aristocrática viciada em jogo, que recorre a ele para saldar um débito. Oferece-lhe pérolas falsas, vendendo-as como autênticas, e o joalheiro, embora logo perceba o embuste, adquire-as sem hesitar, emitindo um cheque substancioso. Só no final descobriremos as motivações de seu gesto, sinal indubitável de que a autora se reapropriou, dessa vez, de suas prerrogativas, voltou a tomar nas mãos os personagens e seus destinos, instituiu situações e motivos, narrando com sua voz inconfundível.